Síndrome da Lexi Howard: Os Eternos Observadores.
Sobre ser a pessoa que vê a vida dos outros acontecer, sobre imaginar eternamente uma vida e crescer se acostumando com o mediano.
“Eu sinto que vivi a maior parte da minha vida na minha imaginação” -Lexi Howard
Lexi Howard é uma das personagens da famosa série “Euphoria” da HBO, a personagem, apesar de estar desde a primeira temporada ganha maior destaque na segunda temporada, principalmente com o dilema de ser uma pessoa “excluída”, mas que ao mesmo tempo sempre esteve em todos os lugares. A personagem é irmã de uma das personagens principais, a Cassie Howard, uma jovem conhecida por causa da sua beleza, popularidade e por causa de fotos e históricos sexuais vazados pela internet, então a Lexi vive nessa sombra da comparação, onde a irmã é naturalmente perfeita e ela se sente inferior e até mesmo ridícula ao tentar ser vaidosa ou confiante.
As duas nasceram em uma família com brigas constantes, uma mãe alcoólatra e o abandono do pai na pré-adolescência, entretanto dentro da série parece ser mais evidente os efeitos na Cassie do que na Lexi. A Cassie aceita comportamentos autoritários e desrespeitosos vindo de homens em troca de um amor falso ou puramente carnal, como forma de buscar essa falta do amor parental, entretanto a Lexi parece não sofrer com isso, mas essa é uma mentira… Um dos efeitos da ausência de um pai pode ser o amadurecimento rápido, e uma necessidade de ser responsável, o que pode justificar como ela raramente se torna o foco da narrativa, porque ela simplesmente não se envolve em nada problemático.
A “Síndrome da Lexi Howard” na verdade é exatamente uma construção de uma imagem de garotas que amadureceram rápido, ou de garotas que se encontram no meio de inúmeros grupos e confusões como meras espectadoras. Ao mesmo tempo que a Lexi sabe de fofocas e acontecimentos dos outros, ela também se torna uma telespectadora da própria vida. A vida dela se torna a vida dos outros.
Nem social demais para fazer milhões de amigos mas com contatos suficientes para não ser excluída, nem inteligente demais para ser uma nerd e nem burra demais pra sentar no fundão, nem rica demais pra fazer inúmeras festas ou conhecer gente rica demais para ser chamada para essas festas, nem rebelde demais pra ter uma ressaca enorme no dia seguinte mas nem inocente demais pra não sair pra essas festas… No final das contas estamos em cima do muro. Um muro que as vezes te curva pra um lado ou outro, mas que nunca deixa você necessariamente ser puxada para um lado.
A Lexi também trás a questão de ver pessoas que ama partirem ou fazerem coisas ruins para elas mesmas e ser impotente demais para ajudar. Estar em cima do muro te faz as vezes ver mais coisas e viver (ou simplesmente observar) os dois lados da experiência, mas muitas vezes só te faz ver aqueles que realmente te comovem ir embora. Aquelas poucas pessoas desses dois lados do muro que se importam com você as vezes não te alcançam pra te puxar, mas ficam lá embaixo te chamando e pulando pra tentar te puxar, mas aí desistem e vão embora.
No fundo não dá pra tirar alguém de um meio quando não sabe pra que lado ir, não dá pra tirar alguém do modo espectador se você não sabe para onde olhar se sair de lá, não dá pra tirar alguém da esperança de um sonho se ela nunca soube o que é viver de verdade… Tanto a Lexi quanto as pessoas que leram e se identificaram não se conhecem, não sabem quem são se não são o que viram, não sabem o que viver depois que viu tanta coisa dar errado pra quem já viveu, mas também não deseja simplesmente não viver.
Assim nascem adultos medianos. Que não desenvolvem habilidades ou grandes conquistas pra serem elogiados mas também não estão na pior condição de vida. Não constituíram logo uma família ou tiveram certeza da faculdade logo de cara, mas também não estão desempregados ou morando ainda com os pais. Estão sozinhos, vendo seus amigos viverem, outros partirem. Sabem que nunca vão ser os mais ricos, os mais inteligentes, os mais prestigiados ou os melhores no que fazem, mas também não terão o extremo oposto de tudo isso.
Apesar disso, constrói outra coisa no âmago, algo que você não pode evitar de senti, a sensação de que ser especial é muito bom… mesmo que a sua sina seja o mediano, ser especial é bem melhor.
É assim que a Lexi se sente depois de conhecer o Angus. Um garoto que não expõe desejar ela de forma carnal, mas expõe o quanto gosta dela, gosta de suas ideias, de como ela vê o mundo, de como ela conversa e das coisas que ela gosta. E apesar de não ter sido um amor intenso e que parecia-se muito simplesmente com amizade, ela se doa. Ela se sente especial. Ela não era mais a sombra da irmã ou a lamentação de uma amiga que perdeu, ou de um pai que nunca mais se lembrou dela… ela era admirada por ele.
E é nessa sensação que agarramos. Nos agarramos quando tiramos uma nota muito boa, quando alguém nos elogia, quando ganhamos algum prêmio, quando desenvolvemos bem uma habilidade, quando conseguimos uma meta ou quando temos uma nova história pra contar… Nasce a dependência acadêmica, a dependência emocional e o grande valor na opinião dos outros. A busca não vira simplesmente em “Que grupinho eu me encaixo?”, mas sim em “Qual é o meu valor?”.
No entanto o baque de não conseguir é um poço bem profundo. Tirar uma nota baixa ou perder uma das poucas pessoas que te admira de verdade se torna uma solidão visceral… O mediano seria aceitável, o extremo positivo seria ainda melhor, mas o extremo negativo é o absurdo. É como ver os erros ao seu redor e cometer os mesmos de forma ignorante, é como já estar bem mas se jogar na tristeza, é como saber o passo a passo para o mínimo e mesmo assim fazer algo inferior…
No final das contas, quando a Lexi vai se expressar, finalmente ser vista, ela mal fala dela… apesar de contar seus sentimentos, a vida não se trata dela, e sim dos outros, já que a vida dela sempre foi o vislumbre de outras vidas, ela acaba se reduzindo a isso… E não dá pra sair desse muro e ficar satisfeita totalmente, então o que a maioria das pessoas fazem é continuar sentadinha no murro, esperando que o mundo assopre um vento forte e te derrube, que alguém te puxe de um dos lados, ou que o murro simplesmente pare de existir… e você, o que vai fazer a respeito disso?